Se formos a qualquer lugar do globo terrestre e perguntarmos a qualquer indivíduo se ele confia nas autoridades, nos políticos, no seu governo, a resposta com certeza será: não 100%.
O índice pode variar de nação para nação, de povo para povo, de cultura para cultura, mas, sim, desconfiamos com razão dos nossos governos.
Isso é quase aristotélico. Qualquer indivíduo meramente racional desconfiará, também racionalmente, dos seus governantes e do seu governo. Isso ocorre devido ao princípio da reciprocidade: aqueles que ocupam o trono mais alto, historicamente possuem o hábito de mentir e omitir informações do público, seja por alegações de um suposto bem maior, ou seja por mau-caratismo daqueles que ascendem ao poder.
Mas estamos falando especificamente sobre o governo americano. Em contraponto ao fato de ser a nação número um no mundo, os Estados Unidos da América carregam também uma grande responsabilidade. Foi assim com qualquer estado que, outrora, esteve no topo. É plausivelmente compreensível que os EUA tenham que manter seu poderio em constante vigilância e, infelizmente, isso inclui omitir informações e esconder dados, não apenas para se resguardar frente aos olhos dos declarados inimigos, mas também para se proteger contra aqueles que não são públicos, que podem estar bem debaixo do seu próprio nariz, entre o seu próprio povo.
Entretanto, existe uma diferença entre vigilância e resguardo, e omissão e mentira — principalmente quando as respostas são devidas e obrigatórias à própria população, ao contribuinte, que nitidamente está vendo tudo o que está acontecendo.
Em 2010, uma pesquisa divulgada pelo Pew Research Center mostrou que quase 80% dos americanos afirmavam não confiar e ter pouca fé de que a enorme burocracia federal pudesse resolver os problemas do país. A pesquisa demonstrou que a confiança pública no governo federal estava em um dos pontos mais baixos em meio século.
O estudo revelou que apenas 22% dos entrevistados confiavam em Washington quase sempre ou na maioria das vezes, e apenas 19% afirmaram estar basicamente satisfeitos com isso. Quase metade dos participantes declarou que o governo afeta negativamente suas vidas diárias, um sentimento que cresceu nos anos posteriores.
No ano passado, a Gallup divulgou uma pesquisa sobre confiança em instituições e atores governamentais, demonstrando que os americanos têm mais fé no governo local (67%) e menos fé no poder legislativo do governo federal, ou Congresso (32%). Entre esses dois extremos, a maioria expressa confiança no governo estadual e no povo americano. Por outro lado, menos da metade está confiante nos poderes executivo e judiciário do governo federal, em autoridades eleitas, candidatos a cargos públicos e na capacidade do governo federal de lidar com problemas domésticos e internacionais.
Já os dados de uma pesquisa histórica — de 1958 a 2024 — divulgados em junho deste ano pelo Pew Research Center mostram que a confiança pública no governo federal, que tem sido baixa por décadas, aumentou modestamente desde 2023. Em abril de 2024, 22% dos americanos disseram confiar no governo em Washington para fazer o que é certo “quase sempre” (2%) ou “na maioria das vezes” (21%). No ano anterior, apenas 16% afirmaram confiar no governo quase sempre ou na maioria das vezes, o que representou uma das medidas mais baixas em quase sete décadas de pesquisas.
Onda drone apenas agrava a falta de confiança pública
Não é preciso nenhuma pesquisa para demonstrar que um “teste de fogo” sobre transparência e confiança pública surgiu para Washington com a atual onda de misteriosos drones em Nova Jersey, que se expandiu para outras partes do território americano. Os avistamentos, que teriam começado em meados de novembro, demonstram uma urgente necessidade de atuação imediata e uma ação de resposta eficaz por parte das autoridades.
O FBI afirmou que iniciou as investigações, mas não soube explicar o que estava acontecendo, enquanto as autoridades locais tomaram a linha de frente na busca por respostas. Mas, claro, isso não é o bastante. O povo americano exige ouvir uma resposta federal clara sobre a situação.
No entanto, espera-se, obviamente, que as satisfações sejam, no mínimo, verdadeiras e não negacionistas. Mas não é o que aconteceu e nem o que está acontecendo.
O presidente Biden foi informado sobre os avistamentos de drones em Nova Jersey. A Secretária de Imprensa da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, afirmou de maneira sistemática: “Estamos monitorando de perto a atividade”.
Uma resposta ineficaz para perguntas tão preocupantes. Não se trata de simples UAS (sistemas de aeronaves não tripuladas) voando por aí. Estamos diante de uma perigosa violação de segurança.
Esses “drones” têm sobrevoado áreas e infraestruturas sensíveis, tanto em solo americano quanto em bases militares dos Estados Unidos no exterior. As violações ocorreram inicialmente em bases americanas no Reino Unido e, ontem, mais uma violação do espaço aéreo de uma base militar americana foi confirmada.
Drones foram vistos sobrevoando a base aérea dos EUA em Ramstein, na Alemanha, no início de dezembro, disse um porta-voz da Força Aérea dos EUA, nesta sexta-feira.
“Não houve nenhum impacto aos residentes, instalações ou ativos da base”, segundo o porta-voz. “Em conjunto com as autoridades da nação anfitriã, continuamos monitorando o espaço aéreo para garantir a segurança da comunidade.”
Antes disso, o Exército já havia confirmado 11 incursões de drones sobre a base militar de Arsenal Picatinny, em Nova Jersey.
Se estamos diante de algo dessa magnitude, não podemos considerar isso pouco importante.
Mas se violações do espaço aéreo americano estão sendo oficialmente relatadas e confirmadas, por que Washington está ignorando a situação, pelo menos publicamente? E por que está tratando o povo americano como se fosse mentiroso?
Sim, foi exatamente isso que aconteceu.
Quando John Kirby, bastante à vontade durante um briefing para a imprensa na Casa Branca, na quinta-feira, diz:
“Muitos relatos de drones em Nova Jersey são apenas aviões normais operando legalmente, e eles não conseguiram corroborar ‘nenhum’ dos relatos de drones.”
White House chimes in on the NJ "drone" thingy.
The more I hear, the more I wonder what truly is going on. pic.twitter.com/2SMi5k9iA6
— John Greenewald, Jr. (@blackvaultcom) December 13, 2024
Isso nos faz perguntar: em qual realidade está vivendo Washington? É inconcebível que eles realmente acreditem — e defendam — que toda uma população de um estado como Nova Jersey esteja passando por uma histeria coletiva, a ponto de estarem apenas filmando aviões e helicópteros. Isso é ainda mais absurdo diante das tantas provas claras e contundentes sendo compartilhadas diariamente nas redes sociais.
Não estamos falando das décadas de 1950 e 1960, quando a CIA e os painéis investigativos conseguiam “vender” Vênus ou gases de pântano como explicações plausíveis.
Estamos às portas de 2025. Os tempos são outros. A troca global de informações é praticamente instantânea. O cidadão comum tem hoje muito mais acesso e espaço para coletar evidências e compartilhá-las. É exatamente isso que vem acontecendo de forma massiva com a onda de drones nos Estados Unidos.
Portanto, não é mais aceitável tratar o contribuinte como uma marionete. Esses tempos acabaram.
A que ponto chegamos? O povo está vendo, o mundo está vendo. Está acontecendo agora, diante dos olhos de todos!
Em vez de negações, a verdade seria muito mais interessante e apropriada.
É necessário resgatar e fortalecer a confiança do povo em seu próprio governo. Mas será que eles se importam com isso? A resposta sempre esteve clara.
Se um governo — seja ele qual for — não se importa com a confiança de seu próprio povo, então ele não governa “para o povo e pelo povo”.
Governa, sim, em prol de interesses pessoais e de um núcleo restrito de interessados.
É fundamental fazer valer o título de “democracia e liberdade”. Isso só pode ser construído, preservado e praticado quando a verdade é apresentada, no mínimo, ao seu próprio povo.